Tentação (Adolfo Caminha)

• Tentação, de Adolfo Caminha, é um livro justaposto com a época da monarquia, como a família real, o Imperador do Brasil D. Pedro II e a Alteza Princesa Isabel.

• Bacharel Evaristo de Holanda fôra convidado pelo amigo Luís Furtado a sair do Maranhão para ir morar no Botafogo, no Rio de Janeiro - cidade de maiores perspectivas financeiras. O amigo lhe prometera um emprego no Banco Industrial. Então Evaristo e sua esposa Adelaide partiram para o Rio de Janeiro deixando a velha cozinheira, a Balbina.

• No Rio de Janeiro foram para a casa de Furtado onde conheceram a esposa dele D. Branca e uma amiga da família D. Sinhá, filha de um desembargador de nome Lousada, vizinho deles. Também conheceram os filhos do casal que se chamavam Raul e Julinha, uma menina ainda de colo.

• A mãe de D. sinhá era Dama do Paço e através dela o casal Furtado e D. Branca conheceram a família Imperial. O secretário do Banco Industrial, Luis Furtado conhecia o Rio de Janeiro de um extremo ao outro e tinha ótimas relações na sociedade fluminense, inclusive com o desembargador Lousada onde por ele conhecera outras pessoas de posições influentes na sociedade. A mulher do desembargador Lousada sendo Dama do Paço, tinha intimidade com a Imperatriz; por intermédio dela é que D. Branca se relacionara com a D. Isabel, princesa imperial e herdeira presuntiva do trono do Brasil! Ela seria a madrinha de batismo de Julinha por procuração.

• Então haveria uma festa na casa do Furtado. O casal iria batizar sua filhinha Julinha e os convidados seriam pessoas ilustres, incluindo o desembargador Lousada, sua esposa, sua filha e outros. No entanto, para Adelaide, isso a estava perturbando pois não tinha uma roupa adequada para vestir na festa como tinha D. Branca. E ela chorava com isso. Porém, seu marido, Evaristo, que iria pegar um empréstimo no banco, acabou por aceitar o empréstimo do amigo Furtado, que seria sem juros e sem prazo para pagar. Com isso, obteve o dinheiro para comprar as roupas.

• Luis Furtado vivia bem com sua esposa, mas não podia ver um lindo rosto de mulher. E foi assim que ele admirou a Adelaide, a mulher de Evaristo de Holanda, desde a sua chegada.

• Chegou o dia do batizado. Todos os amigos ilustres de Furtado compareceram entre eles o desembargador Lousada, a viúva Tourinho, a D. Rosa, mulher do Loyola, tesoureiro do Banco. Vieram também o Valdevino Manhães (Dr. Condicional), o Sr. Visconde de Santa Quitéria, diretor do Banco luso-brasileiro. Adelaide via como um fantasma diante dela toda a Corte Imperial. Mas acabou dando tudo certo.

• Em um outro dia, Luis Furtado fez uma surpresa para o seu amigo Evaristo, comprando toda a mobília de que precisavam para ficarem melhor instalados no andar de cima da casa.

• A família toda agora unida (os dois casais) resolvera em um domingo fazer um piquenique no Jardim Botânico. Furtado convidara para o passeio apenas um dos amigos que devera favores, o Visconde de Santa Quitéria. Seria muito bom para todos curtirem um pouco a natureza e ficarem longe da “Rua Ouvidor” e dos mexericos do bairro.

• Durante o piquenique, por um momento Furtado ficara sozinho com Adelaide e como era muito galanteador jogara algumas palavras na tentativa de seduzi-la. Como Adelaide, talvez por timidez se mantinha calada, fôra beijada por ele. E ainda assim Adelaide não conseguiu dizer mais nada e nem pensou em contar ao seu marido.

• Passado o piquenique Adelaide ficava refletindo sobre a imoralidade de Furtado. “Ou será que ele a amava”?

• A Rua do Ouvidor era o local dos encontros onde se falava muito de política e literatura. Falavam também das mulheres, dos homens, dos amigos, das pessoas enfim. As maiores notabilidades da política, da literatura e das artes, os mais conhecidos escritores e homens de Estado viam-se ali, em grupos, à porta do Café de Londres, do Castelões ou do Pascoal.

• A família real resolve regressar para a Europa e houve um grande movimento de pessoas nas ruas para vê-los se despedindo. Furtado considerava e apoiava o imperador enquanto que Evaristo, republicano, não iria contra as suas convicções. Ele deixara sua esposa ir até o Arsenal da Marinha, ponto de embarque do imperador (monarca), mas ele mesmo não fôra.

• O governo ficou entregue à Sua Alteza Imperial Regente D. Isabel, herdeira do trono.

• Com o tempo começaram os conflitos na casa do Furtado. Furtado e Evaristo sempre discutiam política: enquanto Furtado defendia a monarquia, Evaristo vivia para a república e para o Clube Republicano de Botafogo. E o clima para ele diante dos amigos de Furtado era sempre ruim: - "Canalha de graúdos! Corja de mandriões! Visconde... que quer dizer um visconde? Que quer dizer um barão? Que quer dizer um comendador? Dizia Evaristo”!

• Enquanto isso, Furtado sempre por perto de Adelaide insinuando alguma coisa. E Adelaide, no entanto, já se encontrava um pouco envolvida em seus pensamentos, em sua imaginação: os olhos de Furtado, a boca sensual de Furtado, o rosto inteiro daquele homem que era como uma tentação do inferno a persegui-la, a persegui-la...

• Adelaide, em uma manhã, jurou ir-se embora daquela casa da Corte e fugir para longe, voltar à Coqueiros, na província, onde nunca o demônio lhe sorrira tão de perto.

• Então Adelaide começou a pedir ao seu marido que voltassem para Coqueiros. A princípio ele não queria voltar mas com o tempo vendo sua esposa muito nervosa e sensível resolvera sair do Rio de Janeiro.

• Uma certa noite, enquanto o casal Evaristo e Adelaide tinham se recolhido cedo no quarto do andar de cima viram D. Branca (que ficava na parte de baixo da casa) receber o banqueiro Visconde de Santa Quitéria em uma visita com um pouco mais de intimidade. Furtado na ocasião havia saído.

• Então Evaristo, indignado, encontrara ainda mais razões para ir embora. O bacharel não se conteve: - armou o punho indignado: - “Corja”! E pensava: - “Franqueza, franqueza... ele também se dera muito mal no Rio. Hipocrisia, hipocrisia e mais hipocrisia era o que a gente encontrava. O próprio Luís Furtado e a própria Sra. D. Branca o que eram, senão uns hipócritas? O Visconde, o Desembargador, o Condicional, o Pessegueiro... tudo uma corja de hipócritas”!

• Outro dia, quando Evaristo e Furtado saíram para trabalhar, Adelaide no andar de cima, dera uns gritos finos em uma crise de nervos, talvez. D. Branca, a ama de Julinha e Antônio o empregado correram para cima para acudi-la. No entanto, D. Branca pediu a ama que pegasse o éter para Adelaide que se encontrava desmaiada. Pediu também ao Antônio que fosse ao banco chamar Evaristo. D. Branca não poderia sair dali para chamar o médico porque estava com trajes caseiros para sair à rua.

• Quando Evaristo chegou, foi correndo se encontrar com Adelaide que já havia acordado. Evaristo perguntou por que não chamaram o médico e D. Branca lhe disse que não tinha quem o fizesse isso. Então Evaristo explodiu: - “Deixavam-te morrer, minha mulher, deixavam-te expirar à míngua! - disse o bacharel transbordando ironia. - Onde há dinheiro falta piedade”...

• D. Branca se sentiu ofendida com as palavras de Evaristo e contou tudo ao Furtado, seu marido.

• Naquele mesmo dia Evaristo de Holanda mudou-se para um hotel no Campo da Aclamação. - "Bastava de fidalgos..." Não quis levar os trastes, porque - dizia ele - não lhe pertenciam; recolheu apenas os baús que trouxera do norte. Quando o carro parou em frente à casa do Furtado a vizinhança saiu toda para ficar olhando.

• O secretário ouvia tudo com uma resignação de carneiro imolado, sem proferir palavra, sem a mais leve queixa. Não foi pedir explicações ao amigo: esperou os acontecimentos com a mesma calma de homem que sabe ajuizar dos homens e crê numa fatalidade que a tudo resiste e tudo domina na ordem moral e nas relações sociais.

• Adelaide e Evaristo entraram no carro sem se despedirem. E para Adelaide apenas um objeto perdurava na sua imaginação - triste esfinge na aridez de um deserto - a figura do secretário, mais do que nunca tentadora, numa auréola deslumbrante que o divinizava, olhando-a, todo voltado para ela, todo dela...

• E Furtado, não quis que tomasse a pôr os olhos insaciáveis na miragem que o fizera sonhar noites inteiras, dias inteiros, na ânsia de um gozo novo. E sobre o amigo, pensava Furtado: “de que ia viver Evaristo, agora, sem um amigo que lhe desse a mão”? Por outro lado reconstruía mentalmente o episódio do Jardim Botânico, em que fora protagonista a esposa do bacharel, e sentia extraordinária volúpia cada vez que se lembrava daquele beijo de fogo, mais precioso que todas as riquezas do mundo e cujo calor como que lhe ficara impregnado na boca para todo o sempre... Ela o repelira brandamente, cheia de dignidade, cheia de pudor, fiel ao homem que escolhera para esposo; mas nisso é que estava o sabor esquisito e fidalgo que lhe ainda permanecia, por um efeito da imaginação, nos lábios trêmulos...


Personagens do livro:

• D. Pedro II: Monarca e Imperador do Brasil. Padrinho do Raul, filho do Furtado.
• D. Isabel: Princesa Imperial e herdeira presuntiva do trono do Brasil. Madrinha de Julinha por procuração.
• Visconde de Santa Quitéria: Capitalista, diretor do Banco Luso-Brasileiro.
• Valdevino Manhães (Dr. Condicional): Diretor da Revista Literária e autor de muitos livros, de muitíssimas obras, entre as quais o poema herói - cômico Juca Pirão, paródia ao "I-Juca-Pirama", de Gonçalves Dias. Pequenino, metidinho a critico, um bigodinho quase imperceptível, sempre de lunetas - era conhecido por Dr. Condicional, porque nunca dizia as coisas em tom afirmativo: tinha sempre um mas..., um talvez..., um se..., quando criticava obras alheias. Ninguém para ele era escritor feito, nem mesmo os consagrados: todos haviam de ser grandes poetas, grandes romancistas, grandes homens... se continuassem a estudar. Outra mania de Valdevino Manhães era falar na sua viagem à Europa. - Oh, em Lisboa merecera os maiores elogios, as mais belas referências de quanto jornalista sabe terçar a pena (terçar a pena era uma de suas frases prediletas.
• Luís Furtado: Ele conhecia o Evaristo desde criança, desde os bancos colegiais, quando ambos cursavam o Liceu; eram amigos, amiguinhos como dois irmãos. Luís Furtado era homem de meia -idade, alto, robustez física invejável, pele rósea e conservada, bigode negro, tratado a brilhantina, olhos negros e comunicativos, um pouco lânguidos, talvez por afetação, talvez por temperamento. Belo, verdadeiramente belo, ninguém o diria sem risco de profanar o ideal antigo da beleza máscula; no entanto, podia dizer-se dele que era, na acepção moderníssima, um bonito homem. A convivência na Corte dera-lhe tintas de nobreza ao rosto largo de provinciano setentrional. O Rio de Janeiro, com o seu maravilhoso poder de cidade cosmopolita, afinara-lhe a cútis e a educação. Davam-lhe doutor, mas, em verdade, nunca pusera os pés numa academia; os preparatórios mesmo, ele os não completara; e como no Rio de Janeiro, na Corte, toda a gente é doutor, ninguém punha dúvida no fictício diploma de Luís Furtado. Mas a qualidade característica do secretário do Banco Industrial era o amor às mulheres, uma tendência notável para as conquistas de boudoirs.
• D. Branca: Esposa de Furtado
• Bacharel Evaristo de Holanda: Formado, bacharel em direito, autor de muitos escritos. Casou com Adelaide, uma moça simples e tímida. Tinha uma vida sem ruído, sem luxo, indo logo morar em Coqueiros e acabando por achar aquilo muito fora da civilização, incompatível com a sua natureza irrequieta de homem que não veio ao mundo para morrer obscuro "num lugarejo humilde de província”...
• Adelaide: Rapariga dócil, de coração meigo como o coração das pombas.
• Loyola: Tesoureiro do Banco
• Xavier: Do Jornal de Notícias
• Desembargador Lousada: Vizinho do Furtado e padrinho da Julinha, filha do Furtado. A madrinha dela, a princesa D. Isabel, por procuração.
• D. Sinhá: Filha do Desembargador Lousada.
• Raul: Filho do Furtado e D. Branca
• Julinha: Filha do Furtado e D. Branca