Feliz Aniversário (Clarice Lispector)


D. Anita completava 89 anos de vida, ela morava com Zilda, uma de suas filhas que organizara toda a festa. Ela arrumou a mãe horas antes do horário da festa e a deixou sentada na cabeceira da mesa, onde o bolo, os croquetes e sanduíches de presunto seriam postos. Estava tudo preparado pela Zilda.
Os primeiros convidados foram chegando, primeiro a nora Olaria e depois a nora Ipanema. Quando as duas já não aguentavam mais o silêncio e o tédio do momento, os demais convidados chegaram.
Com o passar do tempo, as crianças já estavam sujas e descabeladas. Os sanduíches e croquetes eram devorados, não sustentavam, mas matavam a fome e as pessoas conversavam. José, o filho mais velho - depois da morte de Jonga - falava para Manoel, seu irmão e sócio, que aquele dia era o da mãe deles, e não um dia para se falar de negócios.
A noite entrava e D. Anita ficava ali sentada, imóvel, sem dizer nada. Um pouco mais cedo ela tinha reparado nos guardanapos e no movimento dos balões quando um carro passava. Porém agora seu rosto era impassível.
Cantaram finalmente o “Parabéns” para D. Anita, alguns em inglês, outros em português. As pessoas presentes diziam para ela partir o bolo. E com uma força que chegou a assustar, a velha partiu o bolo que rapidamente foi devorado por todos.
Os filhos, netos, noras, continuavam a conversar e a comer, mas D. Anita estava chateada pois único que ela gostava mesmo daquela família toda era Rodrigo, um de seus netos; o resto ela olhava com desprezo. Achava ela que todos os filhos fizeram péssimas escolhas para as noras; esposas que não sabiam mandar em uma empregada, esposas que usavam muitos brincos e pulseiras, mas nada de ouro. E os netos seguiam os mesmos caminhos.
Por um momento na festa D. Anita gritou que queria vinho. Uma das netas perguntou se não lhe faria mal. Mas D. Anita mandou que todos fossem para o inferno. Dorothy, então, trouxe um copo com dois dedos de vinho e todos acharam que ela iria reclamar, no entanto D. Anita não falou nada, porém não bebeu o vinho. E todos continuaram comendo e rindo.
Uma nora de D. Anita se levantou pois tinha que ir embora. Em seguida, José foi fazer o discurso. Falou que era um privilégio de poucos poder comemorar o aniversario da mãe, mas se limitava a dizer mais, pois nessa hora sentira falta de Jonga, que era quem fazia os discursos. Desde que ele morrera D. Anita não falara mais nele. De qualquer forma o discurso ficou marcado como um “até o ano que vem”!
Assim a festa acabou e todos deixaram a casa, descendo as escadinhas do prédio e se despedindo na promessa de se verem no próximo ano. Nesse momento as pessoas foram mais amáveis umas com as outras, pois a despedida permitia isso.
Algumas pessoas pensavam na palavra do discurso como uma promessa de que não teriam que se ver por mais um ano, outros, na perspectiva de que Anita vivesse mais um ano. A nora Ipanema fora embora desejando que a sogra vivesse mais um ano para que completasse um número bonito - noventa anos!