Feliz Ano Novo (Rubem Fonseca)


Publicado em 1975, Feliz Ano Novo reúne contos escritos por Rubem Fonseca. O livro sofreu censura durante o regime militar, sendo proibido de circular no ano seguinte ao lançamento. Entre vários contos com críticas sociais, pode-se destacar: “Feliz Ano Novo”, “Passeio Noturno” e “Pedido”.

Em “Feliz Ano Novo”, Pereba e o personagem narrador conversam no apartamento deste na noite de ano novo. Zequinha chega ao apartamento e diz que estava aguardando umas armas que viriam de São Paulo. Então, os três vão ao apartamento de uma velhinha, Dona Cândida, buscar as armas. As armas eram do Lambreta e seriam usadas no dia 2 para assaltar um banco na Penha, subúrbio do Rio de Janeiro.

 Ao retornarem ao apartamento com as armas, ficam observando e decidem usar naquela mesma noite para assaltar uma festa de “bacanas”. Com isso, roubam um carro e partem para São Conrado a procura da casa ideal. Encontram uma festa com pouca gente, colocam as meias na cabeça e entram. Mandam todos deitarem no chão, rendem os empregados e Pereba sobe com uma mulher para encontrar uma senhora doente que estava na parte de cima da casa.

Pereba violenta a mulher e mata as duas. O narrador personagem arranca o dedo da senhora para roubar o anel que não saía. Ao descerem novamente, comem a ceia e um dos homens pede a eles que levem tudo e que não irá dar queixa à polícia. Isso revolta ainda mais o narrador personagem, pois percebe que o que roubaram não era nada perto do que os ricos tinham.

Com raiva, manda o homem se levantar e atira, tentando grudá-lo na parede com a força da potente arma. E mata mais um homem, violenta outra mulher. Assim, eles voltam para casa onde estendem uma toalha no chão com as comidas que roubaram e brindam com um “Feliz ano novo”.

Em “Passeio Noturno” parte 1, o narrador personagem chega em casa depois de um dia de trabalho, sua esposa está jogando cartas e bebendo uísque. A esposa diz que ele trabalha demais e precisa aprender a relaxar. Ele vai para a biblioteca enquanto aguarda o jantar. Depois do jantar, os filhos lhe pedem dinheiro. O narrador vai dar seu passeio de carro, como faz todas as noites. Fica um pouco irritado por ter que tirar antes os carros dos filhos, mas ao olhar seu para-choque com reforço especial duplo de aço cromado sente uma euforia.

Sai à procura de uma rua deserta em busca de sua vítima. Começa a ficar tenso por não encontrar ninguém em condições. Até que vê uma mulher andando apressadamente e carregando um embrulho. Apaga as luzes do carro e acelera em direção à mulher, acertando-a acima dos joelhos. Depois parte rapidamente com o carro, voltando para o asfalto, ainda olhando o corpo desengonçado e sangrento da mulher que havia parado em cima do muro. Ao voltar, verifica orgulhoso, que não havia nenhum arranhão no para-choque. Em casa, a família continuava vendo televisão, a mulher pergunta se ele estava mais calmo depois da voltinha na rua. Ele dá boa noite e vai dormir, pois terá no amanhã um dia terrível no trabalho.

Em “O Pedido”, Amadeu, um português viúvo e já adoentado, resolve pedir dinheiro emprestado a seu compatriota Joaquim, dono de um depósito. Os dois não se falavam havia cinco anos, mas Amadeu estava realmente necessitado. Joaquim acha um abuso o pedido de Amadeu e lhe pergunta por que não pedia para seu filho, que havia se formado doutor. Amadeu lhe conta que o filho havia falecido, não tinha mais ninguém e pretendia comprar uma passagem e ir viver com o neto e a nora, na Bahia.

O motivo da briga dos portugueses era porque enquanto o filho de Amadeu se tornava doutor, o de Joaquim, Manuel, só queria vadiar. Joaquim reclama dizendo que quinhentos cruzeiros era muito dinheiro, mas a miséria de Amadeu e a morte de seu filho doutor dissipam o ressentimento e Joaquim resolve ajudar.

Amadeu, na intenção de ser agradável, pergunta sobre Manuel, filho de Joaquim. Isso faz com que Joaquim se aborreça, entendendo a pergunta como uma afronta e dizendo que o filho é um vagabundo. Então, Amadeu se levanta e vai embora, com dificuldades. Joaquim, envergonhado e com lágrimas escorrendo pelos olhos, corre para alcançar Amadeu, mas este já havia ido embora.

Importância do livro:

O livro Feliz Ano Novo, de Rubem Fonseca, é uma coletânea de contos que giram em torno do tema da violência da vida urbana. A obra foi publicada em 1975, momento em que o país vivia a ditadura militar. E, como tantos outros, o livro também sofreu censura, principalmente por conta do teor de violência das estórias e porque mostravam os problemas sociais que contribuíam para a violência. Além de girar em torno desse tema, os contos narram a vida das pessoas na cidade grande, abordando também outros problemas como a solidão, a melancolia e a desilusão.

Período histórico:

O livro foi lançado durante a Ditadura Militar e como muitas obras críticas foi censurado um ano depois do lançamento. Feliz Ano Novo foi recolhido por conter críticas sociais e contos sobre a violência urbana.

Análise:

No livro de contos Feliz Ano novo, Rubem Fonseca registra a vida urbana brasileira de forma muito realista, o que resulta em um relato brutal de situações cotidianas assustadoras. O autor consegue captar a violência que impera nas ruas do país, principalmente no Rio de Janeiro, que muitas vezes é ignorada pela sociedade em geral.

A violência narrada pode surgir de circunstâncias sociais, como em “Feliz ano novo”. Mas, outras vezes, surge de onde menos se espera, de forma gratuita, como em “Passeio Noturno”. Assim, o autor mostra que a violência está presente na sociedade independente da classe a que pertençam os personagens.

As narrativas em primeira pessoa possibilitam ao autor dar a cada narrador uma voz específica, que se adapta a classe social e a geração de cada personagem. O contexto da cidade também mostra, além da violência, a solidão dos personagens, que estão presos à objetivos de vida fúteis. As histórias abordam a melancolia e a desilusão como características comuns a esses personagens.

Por trás das histórias grotescas, utilizando muitas vezes palavras de baixo calão, o autor faz uma crítica à sociedade que se formava valorizando o consumismo e o individualismo. Algumas cenas chocantes são contrapostas a uma situação de normalidade, mostrando a hipocrisia e o cinismo presentes na vida cotidiana da cidade urbanizada.

Os personagens representam os dois extremos da nação: os que vivem à margem e os que constituem a elite privilegiada do sistema. Esta contraposição, mostrada de forma clara no conto “Feliz ano novo”, ilustra o grande problema da desigualdade no Brasil.

Personagens:

- Pereba (Feliz Ano Novo): personagem de classe baixa, ele comete um assalto com seus parceiros em que violenta e mata algumas pessoas. Justifica sua violência dizendo que as vítimas “engrossaram” e ele teve que tomar uma atitude. Lida com a morte de forma banal, brincando com as armas.

- Narrador-personagem (Passeio Noturno I): o personagem não é nomeado. É um homem de negócios, tem um trabalho estressante numa companhia, tem uma esposa e dois filhos adolescentes. Seu passeio noturno de carro à noite é a forma que encontra de relaxar do cotidiano estressante. Atropela pessoas nas ruas, sentindo uma enorme satisfação e alívio.

- Amadeu (O Pedido): um português viúvo e adoentado que resolve pedir dinheiro emprestado a seu compatriota e inimigo Joaquim. Com muita vergonha, toma coragem para fazer o pedido, mas acaba ficando sem o dinheiro por tocar no assunto do filho de Joaquim, desagradando-o.